Meramente ficção

Nada mudou, nem uma revolução valeu de nada. Os meios midiáticos continuam ditando a forma que vivemos. A manipulação é escancarada nas nossas faces diariamente e não fazemos nada. Temos que consumir, afinal nosso tempo e preenchido pelo capitalismo, somos recarga do sistema e fantoche da mídia.

Em dezembro de 1999 estava me formando a jornalista e havia conseguido um trabalho numa famosa redação de mídia impressa. Tudo estava caminhando perfeitamente, meus sonhos estavam se concretizando. Fui o orgulho de uma família humilde sem nenhum histórico acadêmico.

Entrei na redação como auxiliar de reportagem. Ainda era um foca no meio daqueles velhos tubarões da noticia. Com seus jargões e suas historias vi muitos serem despedidos. O editor chefe era bem claro dizendo que o jornalismo precisava de reformulação e aquelas demissões era a resposta imediata.

No sétimo mês já estava cobrindo a editoria de cotidiano. Achava que a partir dali poderia exercer a escrita ideológica que havia aprendido nos tempos de faculdade. Poderia ser o agente da sociedade, ajudando o cidadão adquirir seus direitos.

As matérias da editoria de cotidiano, eram elaboradas por sete profissionais, seis cobriam os fatos mais importantes e um respondia pelas chamadas pautas frias, noticias que não eram de muita relevância e que poderiam ser realizadas com mais calma.

Era o responsável pelas pautas frias. Muitas vezes era pego pelo tédio de escrever linhas que não interessariam a ninguém. Comemorações que marcava o lado calmo da cidade.

Completado um ano e cinco meses fui chamado a comparecer na sala do editor, que havia me elogiado pelas matérias publicadas. Foi contundente ao me convidar para fazer parte da equipe de seis pessoas. Sem pensar e com um sorriso entreaberto, respondi que seria uma honra.

Minha primeira e única pauta era sobre uma acusação de alteração na gasolina de um posto localizado numa área carente de São Paulo. O meu primeiro passo foi entrevistar possíveis vitimas do golpe, que acabaram intermediando e me levando a uma nova fonte, que forneceu documentos que comprovavam a venda ilícita da falsa gasolina e de uma lista contendo nomes de empresas sonegadoras de impostos.

Tinha todos os ingredientes para formular uma matéria genial que derrubaria as empresas e traria o beneficio a população que estava sendo enganada. Entusiasmado fui direto a sala do editor, mostrei as provas que garantia ser verídica a acusação. Pego de surpresa quando conferia a lista das sonegações de empresas, imediatamente disse que poderia me retirar e mais tarde daria um parecer sobre o futuro daquela matéria.

No final do expediente fui chamado a comparecer novamente a sala do editor. Entrando, ouvi de sua boca que a matéria havia caido. Assustando perguntei por quê? Firme, respondeu que traria problemas ao jornal, pelo nome do patrocinador estar envolvido na sonegação de impostos. Ele completou dizendo que essas coisas são rotina em redações no Brasil, que não se preocupasse porque meu salário viria normalmente no final do mês.

Saindo daquela sala, escondia as lagrimas com a minha mão direita. Voltei e sentei na cadeira por alguns segundos, tive flashes dos quatros anos da minha graduação, em como os professores eram pontuais ao afirmar que o papel do jornalista era defender os interesses públicos a favor da população. Aquela ideologia morria naquele instante, todos os charmes do jornalismo desaparecia. Dali percebi que a censura estava camuflada debaixo de interesses maiores patrocinados por onças pintadas dentro do bolso.

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